sexta-feira, 31 de julho de 2015

Oooops!... Uma conta muito mal feita


Escreve o Diário de Notícias, na peça "As ideias do CDS que a coligação aproveitou", em que introduz este ângulo de leitura do Programa Eleitoral da coligação PaF:
A conta está errada: a soma das 248 páginas do programa eleitoral do PSD, de 2011, com as 75 do CDS, da mesma campanha, não é 148, o número de páginas do projeto da coligação "Portugal à Frente", apresentado na quarta-feira. A síntese alcançada, o que ficou de um e de outro foi resultado de negociações intensas, cedências e trocas, que dirigentes de ambos os partidos, contactados pelo DN, se recusaram a detalhar. "Não se tratou de cedências, derrotas ou vitórias, apenas de um encontro de boas ideias de ambas as partes", limitou-se a sublinhar fonte dirigente da coligação.
Estas diligentes fontes anónimas deviam ter mais cuidado. É que estão a passar a ideia de que o programa da PaF é uma síntese dos programas eleitorais do PSD e do CDS de 2011, há quatro anos.

Ora, se assim fosse, isso significaria que, nestes quatro anos, não teriam feito nada do que programaram... Não é a melhor forma de publicidade.

quarta-feira, 22 de julho de 2015

Um país bloqueado

Na série de divulgação do Manifesto POR UMA DEMOCRACIA DE QUALIDADE, republicamos este artigo de José António Girão, hoje saído no jornal i.

Há que saber com que políticas os dirigentes da actual maioria pretendem aumentar o investimento e as exportações, conter a dívida e reduzir o défice.


Um país bloqueado

Portugal encontra-se confrontado com uma crise de elevadas proporções, nos domínios económico, social e político, a qual é reconhecida pela generalidade da população e de que resulta o desencanto e progressivo afastamento da política por parte dos cidadãos.

É igualmente reconhecido que tal se deve a um conjunto lato de problemas de natureza estrutural, aos quais as instituições e órgãos do Estado não têm conseguido dar resposta efectiva. Esta falha é particularmente notória e grave a nível político, uma vez que num Estado democrático e de direito é a ele que cabem as responsabilidades últimas pelo desenvolvimento, progresso e bem-estar dos cidadãos.

O estado actual, a cerca de três meses das eleições legislativas, das propostas concretas e dos programas eleitorais dos diferentes partidos – e em particular dos pertencentes ao “ arco da governação” – por forma a tornar possível um debate aprofundado e esclarecedor das alternativas em jogo, é particularmente preocupante e até decepcionante. Isto é tanto mais grave quando tudo indica que nenhuma das forças partidárias em disputa conseguirá obter uma maioria absoluta no futuro parlamento, o que reforça a necessidade de os eleitores serem devidamente esclarecidos das verdadeiras intenções partidárias, por forma a poderem votar de forma consciente e responsável.

Face à gravidade dos problemas que defrontamos e às restrições que decorrem da nossa participação na UEM, tal informação é indispensável não só para o voto, mas também para ajuizar das reais possibilidades de compromissos pós-eleitorais, com vista à identificação e implementação de um conjunto coerente de políticas que permitam desbloquear a crise com que nos vimos debatendo. É este um dos grandes motivos de desalento. O cidadão tem de ver como é possível ultrapassar a crise e a incerteza que tanto o têm penalizado, para voltar a poder ter motivação e esperança. É que não basta proclamar a necessidade de confiança... é igualmente necessário fornecer as perspectivas e políticas concretas em que se possa alicerçar a dita esperança!

No momento actual, nenhuma das forças partidárias nos fornece uma perspectiva da sua visão e estratégia para o país, no quadro de um horizonte alargado. No que respeita a esta, ou é inexistente (para o caso da maioria dos partidos) ou é incompleta e algo contraditória (caso do PS, apesar do contributo dado com o documento “Uma Década para Portugal” ).

Com efeito, a coligação PSD-CDS, actualmente no governo, acena-nos com um “Caminho para um País Melhor”. Mas quando vamos à procura desse caminho, não encontramos nada de novo: apenas a reafirmação do rumo prosseguido nos últimos quatro anos que, sem dúvida, nos restituiu alguma credibilidade internacional – fruto de grande perseverança –, mas está longe de nos ter conduzido a uma situação de melhorias e progresso sustentáveis, como os próprios dirigentes políticos da maioria, aliás, reconhecem. Logo, mais do mesmo não chega.

Há que saber com que políticas os dirigentes da actual maioria pretendem aumentar o investimento e as exportações; conter a dívida e reduzir o défice; aumentar a competitividade, as qualificações profissionais e o emprego; reduzir a precariedade no mercado do trabalho e a emigração; melhorar a eficácia da função pública e da justiça; reduzir as assimetrias e desigualdades; e melhorar as condições de vida e o bem-estar da população e, em particular, dos mais desfavorecidos, para só citar algumas das questões fundamentais que permanecem sem solução.

Como é óbvio, a estas mesmas questões devem responder os demais partidos e, em particular, o PS, enquanto partido que aspira a constituir governo. Embora o PS, no campo das propostas, tenha conseguido destaque, o facto é que nem sempre é clara a coerência das medidas propostas com a credibilidade dos resultados visados, o que dificulta a compreensão e é fonte de perplexidades.

No âmbito deste esclarecimento impõe-se igualmente que os partidos clarifiquem devidamente as suas intenções relativamente à reforma do sistema eleitoral, de que tanto se tem falado e que é primordial para uma maior sintonia entre os políticos e o eleitorado. Este domínio, só o PS o inclui no seu programa eleitoral, mas em defesa dum sistema de círculos uninominais, o que pode ser a via mais simples para tudo permanecer na mesma. Como chegar a acordo (é necessária a maioria de dois terços) quanto à definição e número de círculos uninominais?

Pelos exemplos aqui referidos é fácil concluir que temos pela frente desafios de grande envergadura que não será possível ultrapassar sem a definição e clarificação dos grandes objectivos prioritários a prosseguir, bem como da forma (i.e. políticas) para os alcançar. Para tal é preciso clarividência, compromissos devidamente consubstanciados em documentos legais e empenhamento de uma larga maioria; ou seja, é absolutamente indispensável desbloquear o actual sistema partidário e os directórios de interesses em que se compraz. Urge, assim, alcançar um verdadeiro compromisso reformista interpartidário, assente no Estado de direito, na igualdade, na solidariedade e no progresso, que permita desbloquear a situação pantanosa em que nos encontramos.
O mínimo que o país exige é que não percamos mais esta oportunidade! Partidos, mãos à obra!

José António GIRÃO
Professor da FE/UNL

segunda-feira, 20 de julho de 2015

Fernando Henrique Cardoso de facto foi bom

Fernando Henrique Cardoso

O Presidente do Brasil que antecedeu Lula da Silva, de facto, foi eficaz. E conseguiu preparar o terreno para o seu sucessor na Presidência do Brasil, Lula da Silva, fazer as reformas que fez a bem dos mais pobres, dos sem terra.

Mas não se “queimou” como fez Lula da Silva e a actual Presidente Dilma.

E, não tendo que estar tanto às esquerdas, foi um reformador, tendo - ainda - feito parte de uma classe política que hoje, por todo o lado, está em total via de extinção. Digamos que o único que ainda dá um ar de leader é Obama nos EUA. De resto, cada um que actua por todo o lado consegue ser pior, bem pior que o anterior.

Temos o Brasil uma vez mais a arder, agora com Lula da Silva e Dilma a serem queimados pelo que deveram ter feito – utilizado mal – com dinheiros públicos. E, em simultâneo, temos Fernando Henrique Cardoso a estar sempre bem, a dar lições de Cultura e Política hoje e a não ser acusado de corrupção como os seus antecessores e os seus sucessores, na Presidência do Brasil.

E o Brasil, que apesar de se ter esquecido de construir – algo que também não aconteceu e devia ter acontecido no tempo de Fernando Henrique Cardoso – as infraestruturas de comunicação no País, parecia que poderia aproveitar toda a sua riqueza, a bem do País e da População e crescer sustentadamente e com futuro. Não está a conseguir; e vai ser dramático.

Fernando Henrique Cardoso enquanto Presidente do Brasil fez Obra, enquanto Director-Geral da Unesco fez Obra, e hoje ainda dá ensinamentos a quem o queira ouvir, e ler.

Com pena de quem se encontra mais à esquerda que FHC – caso do que escreve aqui e agora, estas linhas – é também pena que Lula da Silva não tenha conseguido manter-se numa linha que o não levasse para a corrupção, e Dilma ainda pior.

Se se sabe que o Poder Corrompe, tem que haver baias para que tal não aconteça, tem que haver transparência total para que tal não aconteça, e tem que haver vergonha quando acontece.

Mas não está a ser o caso. Claro não só no Brasil, mas uma vez mais no Brasil.

Mesmo que possamos estar mais à esquerda, temos que elogiar Fernando Henrique Cardoso; e apontar o dedo a Dilma, que, como muitos previam nas últimas eleições, apesar do adversário não ser uma pessoa exemplar – algo que se esvaiu globalmente na política e nos políticos – confirma-se que seria um perigo para o Brasil e um mau exemplo ao Mundo. Verdade indesmentível, hoje!

Augusto KÜTTNER DE MAGALHÃES
19 de Julho de 2015

sábado, 18 de julho de 2015

A prova do crime no "caso Camarate"

«Planta topográfica do local onde se despenhou a aeronave CESSNA 451A,
YV-314P, na qual se encontra assinalada a faixa de terreno
onde foram encontrados vestígios provenientes do fogo
que destruiu aquela aeronave (tracejado vermelho)»
[clique para ampliar]

Não é a única prova do crime que matou Sá Carneiro e Adelino Amaro da Costa, em 4 de Dezembro de 1980, junto com os que os acompanhavam: Snu Abecasis e Manuela Vaz Pires Amaro da Costa, o chefe de gabinete do Primeiro-Ministro, António Patrício Gouveia, o piloto Jorge Albuquerque e o co-piloto Alfredo de Sousa. Mas é a prova que mais cedo me impressionou de forma peremptória e irreversível; e que comprova, a meu ver em termos irrefutáveis, o atentado cometido.

Também é aquela prova que deixa em piores lençóis as autoridades aeronáuticas e judiciárias que conduziram de modo deplorável as investigações; e a prova que mais enterra no embaraço o Ministério Público, que bloqueava e continuou sempre a bloquear o inquérito judicial sério e o julgamento do crime.

A prova corresponde a parte do registo documental do "rasto" deixado pelo avião CESSNA 451A, YV-314P, na sua rota fatídica final, naquela noite de 4 de Dezembro de 1980, em que, depois de ter descolado da pista do aeroporto da Portela, logo se despenhou no bairro de Camarate, um pouco à sua frente. 

A importância deste "rasto", como ficou designado e conhecido no "caso Camarate", é determinante. O "rasto" compunha-se de vários resíduos procedentes da aeronave e encontrados no solo, no aeroporto e junto às casas do embate final: pedaços em fibra, fragmentos vários, folhas de papel, sendo muitas procedentes do manual do avião que se guarda ao lado do piloto, etc. Estes materiais encontravam-se chamuscados ou queimados e foram, depois de recolhidos, analisados no Laboratório de Polícia Científica, que certificou a sua origem e natureza. 

Qual era, então, a dúvida que, neste ponto crucial, empatou longamente o processo? 

Se os pedaços de papel e outros fragmentos tivessem procedido da aeronave em voo, ficava claro e inequívoco o atentado: ao terem sido expelidos pelo avião em voo, isso provava que o avião tinha um buraco por onde saíam; e, ao estarem queimados, isso provava que o avião já estava a arder (com um fogo intenso interior) ainda a voar - ou seja, tinha explodido um engenho localizado, que abrira o buraco e desencadeara o incêndio a bordo.

Se tivessem, porém, resultado somente do grande incêndio e combustão final do avião depois de embater nas casas e se imobilizar no solo, os factos não provavam nada: o "rasto" não era rasto e os resíduos teriam decorrido da sua projecção na atmosfera pelo ar quente do incêndio final e seu depósito posterior no solo, "soprados" pelo vento ou, não havendo vento, depositados de modo anárquico e desordenado.

Estes materiais não foram encontrados no solo nos mesmos locais, nem foram achados e recolhidos pelas mesmas pessoas e mesmas equipas investigatórias, na madrugada e no dia seguinte ao da noite em que ocorreu o sinistro. Uma brigada da Polícia Judiciária, chefiada pelo inspector Pedro Amaral, trabalhou nos terrenos do aeroporto, que percorreu, numa extensão de cerca de 500m, desde o topo da pista de que o avião descolara até à cerca de arame que delimita os terrenos do aeroporto já na proximidade do bairro de Camarate. E a equipa do inquérito técnico-aeronáutico ("comissão Viçoso"), no âmbito da DGAC, recolheu, por seu turno, os vestígios encontrados nas cercanias das casas onde o avião acabou por embater até ao exterior da cerca que delimita o aeroporto, numa extensão de cerca de 100m. O diálogo entre as duas equipas não foi grande e também ninguém se esforçou em articular os achados de uma e de outra... Mas ambas souberam, ao longo do tempo, dos achados relatados pela outra.

A brigada da Judiciária relata consistentemente que, nas buscas feitas a 5 de Dezembro, encontrou restos de materiais procedentes da aeronave dispersos pelo solo ao longo de toda a extensão em que trabalhou, no que identifica como um "corredor" com uma largura de 10m a 30m e um comprimento de 500m a 550m, desde o topo da pista de descolagem até ao local do embate final. Esta brigada não teve, porém, nem meios, nem condições e tempo para aprofundar o seu achado. Depois de o haver relatado internamente, esta equipa da Judiciária, do sector dos homicídios, seria totalmente afastada do processo, que ficaria confiado unicamente a uma equipa do sector do combate ao banditismo. Antes de ser afastado, cerca de uma semana depois do sinistro, o inspector Pedro Amaral teve, porém, o escrúpulo e o cuidado de relatar por escrito para o processo aquilo que a sua equipa havia encontrado nos terrenos do aeroporto, bem como a leitura empírica que fazia do achado - e foi graças a este cuidado que o "rasto" não desapareceu totalmente do processo sem deixar rasto.

Esta equipa da Judiciária manteve sempre, ao longo dos anos, o relato substancial do que haviam encontrado, mas de que não ficou mais registo material do que os vestígios enviados para o Laboratório de Polícia Científica (e por este analisados) e um esboço improvisado feito por um desenhador, de nome Carichas. Não tiveram tempo, nem condições para tirar medidas exactas no solo, nem para articular com os técnicos da DGAC os respectivos achados e o seu significado ou para elaborarem um levantamento topográfico rigoroso de todo o encontrado.

Por seu turno, a equipa da DGAC (que foi a grande responsável pela construção precipitada da tese do "acidente", que dominou e viciou o processo praticamente desde o início) cedo formou a opinião de que todos esses resíduos queimados teriam resultado unicamente do incêndio final do avião no solo. E, para isto, adiantou uma conjugação de dois alegados "efeitos": o "efeito de chaminé", pelo qual o avião, em combustão final entre duas casas, teria projectado para o ar esses resíduos que teriam sido arrastados pelo vento, depositando-se depois no solo segundo a direcção deste; e ainda um famoso "efeito de túnel", explicação avançada quando os técnicos eram confrontados com relatos de que os vestígios teriam sido encontrado no solo numa extensão prolongada e ordenada em linha com o percurso de queda final do avião. Este fantasmático "efeito de túnel" corresponderia a que o avião teria deixado na atmosfera, com a sua deslocação final a cerca de 180 km/h, um vazio de pressões atmosféricas que teria sugado esses vestígios leves no sentido contrário ao da sua deslocação - uma imaginosa tese verdadeiramente extraordinária!

Todas estas teses surgiram no confronto de factos e posições ocorrido logo nas II e III CEIAC, os inquéritos parlamentares realizados nos anos de 1984 a 1987 e em que também participei como representante dos familiares das vítimas - não era deputado na altura.

Foram inúmeras as diligências efectuadas em torno do "rasto", quer com o inspector Pedro Amaral e outros agentes da sua equipa, quer com outros elementos da Judiciária e os técnicos da "comissão Viçoso" da DGAC. Os deputados deslocaram-se, com polícias e técnicos, várias vezes, aos terrenos do aeroporto e ao bairro de Camarate, reconstituindo com pormenor e rigor o achado dos vestígios e tirando medidas exactas do solo, em largura e em comprimento. E debateram longamente, em contraditório, toda a matéria, em inúmeras sessões dos inquéritos parlamentares e no próprio local do sinistro. Foi encomendado, ainda, um estudo pericial ao Instituto Superior Técnico, pelos Profs. Brederode e Mário Nino, cujas conclusões apontaram claramente para o atentado.

O confronto de visão dos factos (e sua interpretação e conclusões materiais) persistia, porém: de um lado, aqueles que insistiam na extensão do achado e na sua distribuição uniforme pelo solo; do outro, aqueles que afirmavam não ser assim e que tudo tinha sido efeito do vento e do "túnel". Frise-se, aliás, que na noite do sinistro não havia vento: os registos meteorológicos da noite de 4 de Dezembro de 1980 indicavam no aeroporto uma ligeiríssima e irregular brisa de 4 a 5 nós, isto é, nada.

Numa destas maratonas parlamentares, na comissão de inquérito, já em 1986, quando se analisava a extensão do "rasto" achado pela brigada Pedro Amaral e os relatos diferentes da DGAC, um técnico desta revela, para surpresa geral, que a DGAC tinha feito um levantamento topográfico rigoroso e o correspondente registo documental do que achara, na zona onde trabalhara: o tal espaço entre as casas do despenhamento e a cerca exterior dos terrenos do aeroporto.

A comissão de inquérito quis, então, saber onde estava esse levantamento topográfico, pois nunca tinha sido visto e não constava do processo, nem o da PJ, nem o da DGAC. E os técnicos prometeram que iam procurar encontrar e que o facultariam à comissão.

É aí que acontece esta correspondência oficial, absolutamente espantosa e reveladora, em que se produz, afinal, a prova do "rasto".

A comissão de inquérito começa por questionar a ANA, que informa nada ter em sua posse. E, em 4 de Julho de 1986, dirige-se à DGAC, pedindo «o levantamento topográfico do local onde foram detectados os vestígios provenientes da aeronave sinistrada na noite de 4/12/80, bem como todos os elementos anexos (fotografias, fragmentos, listagens, etc).» - ofício nº 35/CEI/CAMARATE/86.

A DGAC responde a 10 de Outubro de 1986, pelo ofício refª 55821/DMA-A71/AV-17/86, a que junta cópia do tal levantamento topográfico, mas procurando ainda influenciar a leitura e interpretação dos dados objectivos no sentido da tese que sempre sustentara e em que viciara o processo desde o início: apenas incêndio final no solo, a seguir ao despenhamento.

Escreve a DGAC: «Junto se envia (...) uma planta topográfica do local onde se despenhou a aeronave CESSNA 451A, YV-314P, na qual se encontra assinalada a faixa de terreno onde foram encontrados vestígios provenientes do fogo que destruiu aquela aeronave (tracejado vermelho). Esta Direcção-Geral não possui quaisquer outros elementos (fotografias, fragmentos, listagens, etc.) relativos aos referidos vestígios, por terem sido oportunamente remetidos à Polícia Judiciária.» [Nota: o negrito e sublinhado são meus.]

Olhemos, agora, a planta com atenção, como consta da imagem publicada no início deste post e conforme o anexo do ofício da DGAC.

Vê-se, empiricamente, impressivamente, à vista desarmada, que: primeiro, é efectivamente um rasto e não uma deposição anárquica e desordenada de detritos voando de uma chaminé ou de uma fogueira; segundo, esse rasto corresponde exactamente, metro a metro, ao percurso de queda final do avião como se fosse uma sua impressão digital, em traçado subjacente ao seu voo.

O avião embateu - e imobilizou-se - contra as casas que estão representadas imediatamente adiante, em linha recta, do topo superior da área representada a tracejado. Esta área tracejada contém, ainda, um "cotovelo", bem representado no levantamento topográfico e claramente observável. Ora, por maior que seja a imaginação de alguém, o "vento" não faz curvas assim, nem há fantásticos "túneis" atmosféricos que pudessem explicar esta ocorrência.

O que explica, então, este bem impressivo "cotovelo"?

Na vertical desse lugar, junto à estrada representada no mapa, havia um traçado de linha de energia eléctrica (por onde era abastecido o bairro de Camarate). O avião, que se despenhou, voando ligeiramente flectido sobre a sua esquerda, cortou esse traçado de energia eléctrica com a asa esquerda, nesse exacto local; e, ao fazê-lo, flectiu um pouco mais sobre a esquerda, nesse mesmo local, indo embater logo a seguir nas casas em frente. Tudo isto consta da reconstituição dos embates e queda do avião, no processo do "caso Camarate".

Dizendo de outro modo: o "cotovelo" bem representado no levantamento topográfico rigoroso da DGAC é a assinatura bem legível do "rasto" e de que este procedera do avião em pleno voo. O que é prova, inequívoca, insofismável, irrecusável, de que: primeiro, o avião tinha um buraco por onde expelia resíduos em voo; e, segundo o avião, já vinha a arder no seu interior, pois os resíduos expelidos estavam queimados ou chamuscados.

Foi a partir deste mês de Outubro de 1986 que, perante esta prova, me convenci irreversivelmente do atentado e da chocante incompetência do inquérito da DGAC, da PJ e do Ministério Público - ou pior ainda.

Numa extensão de apenas cerca de 100m de terreno analisado, a DGAC confirmou, afinal, e documentou aquilo que a brigada policial de Pedro Amaral encontrara também noutros 500m adentro dos terrenos do aeroporto e fora sempre, oficialmente, desmerecido, desvalorizado e ignorado. E, para quem andou nas diligências várias de investigação no local, não ficou a mais pequena dúvida de que, se tivesse sido logo ordenado um levantamento topográfico completo, esta representação do rasto a "tracejado vermelho" iria terminar, para lá da cerca do aeroporto, bem adentro dos seus terrenos, em cima do topo da pista de onde o avião descolara e numa extensão total de 500m a 600m.

Como foi possível esconder do processo durante quase seis anos este levantamento topográfico da DGAC e o seu inequívoco significado?

Como foi possível a DGAC fazer de conta de que não tinha este achado, nem este levantamento topográfico e continuar a confabular sobre "efeito chaminé" e "efeito túnel", intoxicando o processo?

Como foi possível que os responsáveis da PJ, se alguma vez o viram ou conheceram, não terem logo notado que isto coincidia com o que o inspector Pedro Amaral e os seus homens sempre relataram e era o seu prolongamento já no exterior dos terrenos do aeroporto?

Como foi possível não apurar responsabilidades disciplinares na DGAC, quando tudo isto se tornou incontestável em finais de 1986?

Como foi possível o Ministério Público, a partir destes factos objectivos documentados e desta data, 10 de Outubro de 1986, continuar a persistir no erro original?
 

Lembremo-nos de Nelson Mandela

Nelson Mandela

Nelson Mandela nasceu no clã Maddibda em 18 de Julho de 1918 e morreu em 5 de Dezembro de 2013, tendo sido "Preto" – cor de pele exterior, mas tão "branco" ou muito mais, o que quer que isto possa significar, por dentro, que todos os brancos do mundo – advogado, defensor de direitos humanos, leader rebelde e em 1991 eleito Chefe  – merece ser apelidado de leader, por o ter sido, de facto – do ANC.

Presidente da África do Sul entre 1994 e 1999, ganhou o Prémio Nobel da Paz em 1993. Nelson Mandela, como preso político, esteve detido 27 anos e, depois de muitas pressões internacionais, foi libertado em 1990, quando na África do Sul a guerra civil, consequência do Apartheid, estava no seu apogeu.

Teve uma vida familiar menos fácil, com o primeiro casamento complicado bem como o segundo, com a morte de um filho, com prisão pelo meio.

E, quando libertado, não se quis vingar de nada, nem de ninguém; quis fazer pazes, quis fazer consensos – palavras que hoje deixaram de ter conteúdo – e conseguiu. E pacificou a guerra civil na África do Sul, e os “pretos” passaram a ter “direitos e não só deveres”. Passaram a poder circular nos mesmos passeios que os brancos, andar nos mesmos transportes colectivos que os brancos, a poder utilizar as mesmas casas de banho, passaram a ser Pessoas – que nunca tinham deixado de o ser, mas havia brancos que os achavam (e acham?) inferiores. Não são!

Nunca foram!

Foi um conciliador, foi um exemplo a ser seguido por tantos, hoje, num tempo em que estamos com um total défice de valores, de Pessoas que não sejam meros chefes políticos, mas verdadeiros leaders.
Por certo, neste 18 de Julho de 2015, não será necessário fazer festejos para lembrar Nelson Mandela, talvez seja suficiente utilizarmos cada um de nós, um minuto do nosso dia a pensar no que foi este Homem, no que lutou, do que não teve necessidade de se gabar, vangloriar, como hoje quando nada se faz, tantos se gabam de algo ter feito.

E, aproveitando a ocasião para relembrar algo de que andámos tão distraídos com tantas outras coisas, que se calhar nem nos apercebemos, ter acontecido, que foi o nosso ex-Presidente da República, Jorge Sampaio, ter recebido o Prémio Nelson Mandela, entregue este ano pela primeira vez pela Nações Unidas, a personalidades que se distinguiram na defesa da humanidade.

Jorge Sampaio destacou-se como Presidente da Aliança das Civilizações, enviado especial na Luta contra a Tuberculoses, na sua acção a favor de Timor-Leste e como apoiante da democracia portuguesa. O Prémio ser-lhe-á entregue nas Nações Unidas em Nova Iorque, no próximo dia 24 de Julho.

Esperemos que os nossos telejornais, os nossos jornais, as nossas rádios possam dar algum relevo a este facto. Esperemos, com algumas naturais dúvidas!

E então, se possível for, lembremo-nos sem mágoa, sem saudade, sem Fado nem Futebol, no dia 18 de Julho de Nelson Mandela, até com alegria de ter feito o que fez, e de ser lembrado tão positivamente.

Claro que cometeu erros, mas é próprio de qualquer Pessoa os cometer, mas o saldo de Nelson Mandela é muito positivo, fez muito pela África do Sul, pelos Pretos, e pela Humanidade em geral.

Muitos mais terão nascido nesse dia e não fizeram História, e Nelson Mandela fê-lo, e ainda bem, para não ser tudo mau.

E pode ser que comece a surgir uma nossa classe política, novos Leaders , num tempo em que só temos chefes, e maus. E não esqueçamos a História, não façamos a Memória como só um mês tivesse, e consigamos fazer melhor por todos e por cada um, sem a anulação do individuo como está a acontecer, mas sem nos massificarmos de tal forma, que já nem pensar sabemos. Por nós!

Viva Nelson Mandela.

Augusto KÜTTNER DE MAGALHÃES
18 de Julho de 2015

sexta-feira, 17 de julho de 2015

A falta de solidariedade com a Grécia: ora, puxem lá das calculadoras!

Plenário da Assembleia da República
3-Julho-2015

Todas as posições são legítimas, mas - é sabido - há umas que são mais verdadeiras do que outras. E algumas há que são completamente enganadoras e muito mentirosas.

Um dos mais flagrantes exemplos actuais é a ideia - e a afirmação - de que não tem havido (e não está a haver) solidariedade internacional com a Grécia, sobretudo por parte da União Europeia e dos seus Estados-membros.

Vamos, então, fazer umas continhas:
  • 2010 - 1º resgate: empréstimo à Grécia de 110 mil milhões de euros da troika
  • 2012 - 2º resgate: novo empréstimo à Grécia de 130 mil milhões de euros da troika 
  • 2012 - haircut, reestruturação da dívida grega, com perdão de 107 mil milhões de euros à custa dos credores, privados incluídos
  • 2015 - ELA, ajuda de liquidez de emergência do BCE, até mais de 90 mil milhões de euros
  • 2015 (em discussão) - 3º resgate: novo empréstimo de 86 mil milhões de euros do MEE - Mecanismo Europeu de Estabilidade 
Se a minha calculadora não mente, os montantes de ajuda disponibilizados à Grécia em cinco anos, ascendem a 523 mil milhões de euros! Tudo à custa do esforço de todos os outros, no equivalente a três vezes o nosso PIB.

Só a ajuda de liquidez de emergência assegurada pelo BCE, para que os bancos gregos continuassem a operar e as máquinas de multibanco a funcionar nestas semanas difíceis, foi superior ao nosso único resgate com a troika de 78 mil milhões de euros em 2011. E o perdão de dívida de que o Estado grego beneficiou foi equivalente a 52,3% do seu PIB desse ano e a cerca de 1/3 da dívida então existente.

Se isto tudo não é SOLIDARIEDADE, então já ninguém sabe o que significa a palavra solidariedade.

Tratem é de responsabilizar a incompetência dos governos gregos e a gritante irresponsabilidade dos seus políticos e dirigentes. E deixem a Europa e os outros europeus em paz.

Ainda está aí alguém?


O grande apagão demográfico de Portugal vai-se cumprindo, com a impressionante regularidade de um relógio. É um relógio que anda para trás - mas com cadência certa.

A última notícia foi esta: Portugal perde quase 0,5% da população num ano (Jornal de Notícias). Notícia que já tinha aparecido mais correcta (os números são referentes a 2014 e não 2015) e completa, aqui: Portugal "perde" 200 mil pessoas em cinco anos e isso é preocupante (Público). 

Há, porém, ainda, quem desdenhe destes dados ou desvalorize o seu significado; ou que considere os números não representativos e os qualifique de alarmistas. Vale a pena, portanto, recapitular algumas fundamentais informações objectivas.

Já escrevi alguns posts sobre este tema, a saber: Portugal do futuro: a catástrofe demográfica (Fevereiro 2012); A encolher... (Junho 2013); e O abismo demográfico (Setembro 2013). 

O primeiro dava conta das previsões demográficas das Nações Unidas para este século, com grande extensão, pormenor e variedade de dados - notícia com que deparei em Maio 2011, em plena campanha eleitoral para as legislativas de há quatro anos e a que ninguém ligou importância, nem debate motivou. E o título já assustava: Portugal vai perder 4 milhões de pessoas até 2100.

Ora, aquilo a que estamos exactamente a assistir, ano após ano, é ao cumprimento pontual desse quadro previsional. 

Os números de 2012 já o indicavam, como sublinhei no post A encolher...  - no ano anterior, a perda de população portuguesa fôra de 55 mil habitantes. E é isso mesmo que, agora, se confirmou de novo quanto a 2014: uma perda de 52.500 pessoas em 2014. 

Este cenário é, aliás, um pouco pior do que o apresentado pela "variante média" das Nações Unidas, que foi noticiada em Maio 2011 e que previa, naquele ano, uma perda média na população portuguesa de 47.000/ano para os anos futuros - como ilustrei, significava perder o equivalente à cidade do Porto a cada cinco anos! Esta "variante média" já foi corrigida, entretanto, para um pouco melhor, pelas Nações Unidas, passando a apontar, no final do século, para uma população portuguesa de 7.457.000, com uma perda acumulada de população de cerca de 3,1 milhões desde 2010 e uma perda média de 34.811 habitantes/ano.

Ora, a realidade está a ser bem pior do que isso: com números de perdas superiores a 50.000 habitantes/ano, o cenário assemelha-se mais à hipótese de "variante fertilidade constante" das Nações Unidas, perdendo-se a cada cinco anos o equivalente ao somatório dos concelhos de Cascais e Oeiras e chegando a 2100 com uma população de 6 milhões e uma perda acumulada de 4.587.000 de pessoas entre 2010 e ao final do século (perda média anual de 50.966 habitantes).

Portanto, não é tema com que devamos brincar, nem desdenhar. As Nações Unidas apresentam, aliás, uma previsão ainda mais pessimista, dita de "variante baixa": nesta hipótese, a população portuguesa será (não desmaiem...) de 4.425.000 no final do século, com uma perda acumulada de população de cerca de 6,2 milhões a seguir a 2010 e uma perda média de 68.500 habitantes/ano.

São, em qualquer caso, números de catástrofe. Com consequências económicas e efeitos sociais terríveis. Quando iremos todos despertar?

Um judeu que foi salvo por Cristãos quer hoje fazer o recíproco

Lord George Weidenfeld

Um judeu - como tantos, entre os quais permito incluir o meu avô materno - que em 1938, aquando do Anschluss, teve que fugir da Áustria para o Reino Unido, foi ajudado aqui neste caso por Cristãos, quer hoje fazer o mesmo com Crianças Cristãs, que estando a ser trucidadas pelo putativo Estado Islâmico, têm que fugir da Síria e do Iraque para sobreviver, e ser ajudados para que tal possa acontecer.

Nestas ocasiões de desespero, quer-se estar vivo e não perder tudo, tudo, quando a casa, o lar, os bens materiais já foram saqueados, quer-se defender a própria Vida e alguma Dignidade.

E não é de todo fácil, como me foi contado, ao vivo, por minha avó materna cá, e meu avô em Londres, que fizeram respectivamente Áustria/Porto, Áustria/Londres, também em 1938. E não poucas vezes, nas mais diversas situações, esquecemo-nos do que nos fizeram.

Aqui não está a ser o caso, e é um acto de beleza humana a realçar.

George Weidenfeld,  há 77 anos, com 18 anos, foi ajudado a fugir da Áustria - ocupada pelos Nazis - pela Organização Cristã Plymouth Brethren, que evacuou crianças em perigo, sob a ameaça Nazi.

Hoje, com 95 anos, no Reino Unido, diz querer “pagar” o que lhe foi feito por Cristãos, sendo ele Judeu. E, hoje, o que o putativo Estado Islâmico está a fazer a estas crianças é semelhante ou pior, segundo o próprio, ao que os Nazis fizeram a crianças judias em 1938, e salvas como é o seu caso por Cristãos.

O Fundo que pretende criar para fazer a ponte e salvar estas crianças cristãs Sírias e Iraquianas do opressor Estado Islâmico, está a ser um agradecimento por algo que lhe aconteceu inversamente.

E convenhamos que, para quem seja crente, seja Judeu, Cristão ou Islâmico, tem a virtude de ser crente, quando os que o não somos não a temos, mas ajudar uns de uma Religião, outros de outra Religião, como em 1938 fizeram Cristãos com Judeus, sem esperar nada em troca, e hoje ser possível repagar-lhes, é digno, muito, de ser “louvado” –  deve ser o termo mais indicado!

A minha família seria mais velha em 1938: quando fugiram, já não eram crianças, mas claro que foram ajudados, no caso, talvez não por outros de alguma Religião, mas por Pessoas dignas que o quiseram fazer.

Mas aqui, há que felicitar/louvar, George Weidenfeld, Judeu salvo por Cristãos em 1938, e hoje a querer estes salvar em circunstâncias de total brutalidade Humana! Que se repete, repete, repete…

Bem-haja George Weidenfeld!

Augusto KÜTTNER DE MAGALHÃES
16 de Julho de 2015

quinta-feira, 16 de julho de 2015

Os sons que os políticos não escutam

Na série de divulgação do Manifesto POR UMA DEMOCRACIA DE QUALIDADE, republicamos este artigo de António Pinho Cardão, ontem saído no jornal i.
É preciso uma mudança no fazer política em Portugal. Os grandes partidos democráticos ou encontram novos protagonistas que ajudem na mudança da cultura instalada ou acabarão por ser substituídos.

Os sons que os políticos não escutam

Conta-se que um imperador japonês, preocupado com o avançar dos anos e a sorte do seu povo, entregou o seu jovem filho ao conselheiro mais sábio da corte para o educar com vista à sucessão.
O sábio conselheiro falou com o príncipe e, como primeira lição, mandou-o ir para a montanha, com instruções de só regressar quando conhecesse todos os sons da floresta.
Passados uns tempos, o príncipe regressou e foi à presença do sábio relatar os sons que aprendera: o estrondo do ribombar do trovão, o fragor dos grandes terramotos, o rugido das feras na floresta e o estrépito dos rios caudalosos, entre outros ruídos mais ou menos graves e estridentes.
O sábio apreciou a sabedoria do príncipe, mas mandou-o de novo para a floresta, pois havia ainda muitos mais sons a registar.
Redobrou de trabalhos e cuidados o príncipe, de forma a regressar o mais cedo possível ao palácio, habituado que estava ao conforto da corte. E quando novamente se apresentou ao sábio, já conhecia mais sons: o sibilar do vento na copa das árvores, o ciciar dos pássaros nos ninhos, o vagido da cria acabada de nascer, o cachoar da água na pequena torrente.
O sábio conselheiro apreciou o progresso, mas mandou-o de novo para a floresta, porque ainda não conhecia muitos daqueles sons imprescindíveis para ser um bom imperador.
Retornou o príncipe à montanha e aplicou-se denodadamente na tarefa de escutar e aprender, sempre na mira de regressar depressa à corte.
Começou então a distinguir a vibração do voo das borboletas, o ténue murmúrio das plantas a crescer, o bulício da gota de água caindo de folha em folha ou o leve rumor do grão de semente a germinar na orla da floresta. E muitos, muitos mais sons, que no início nem qualquer ouvido afinado conseguiria sequer imaginar.
Voltou então ao palácio e relatou minuciosamente os novos sons que conhecia. O conselheiro mais sábio da corte ouviu-o com toda a atenção.
E logo, depois de um aceno de satisfação, fez uma vénia profunda ao príncipe seu discípulo, ao mesmo tempo que dizia ao imperador: “Meu senhor, o vosso filho está preparado para governar este vasto império.” “Mas porquê?”, perguntou o príncipe. “Porque já sois capaz de ouvir o não audível, de perceber o imperceptível, e assim estais preparado para escutar os anseios mais profundos do vosso povo.”
Julgo que a história encerra uma enorme lição para os nossos políticos e todos os políticos dos nossos tempos.
É que, nos tempos que correm, eles só estão preparados para ouvir os grandes ruídos: o estrondo das manifestações, o fragor das greves dos serviços públicos, o estrépito das corporações que detêm o efectivo comando das infra-estruturas básicas, o ribombar de quem tem o poder de perturbar ou o eco longo de quem pode dar ou retirar votos. Os desejos profundos das populações não são escutados, muito menos apercebidos, no meio do vozear infrene em que os políticos se movem e tantas vezes promovem.
É preciso uma mudança no fazer política em Portugal. Os grandes partidos democráticos ou encontram novos protagonistas que ajudem na mudança da cultura instalada ou acabarão por ser substituídos. Eles devem ser os primeiros interessados numa reforma do sistema eleitoral que imponha a escolha dos melhores, e não de nomenclaturas volúveis, ao sabor dos chefes que apareçam a cada momento.
Novos protagonistas que, juntos àqueles que já deram provas de dedicação à causa pública e existem em todos os partidos, sejam capazes de formular as melhores políticas e de entender que as melhores políticas raramente são aquelas que as corporações se habituaram a exigir com o habitual estrondo.
António PINHO CARDÃO
Economista e gestor - Subscritor do Manifesto por Uma Democracia de Qualidade

terça-feira, 14 de julho de 2015

A produtividade da Alemanha e a de Portugal


Segundo os últimos dados estatísticos sobre Trabalho e Produtividade, dos países da OCDE, constata-se algo que todos estamos fartos de saber, que a Alemanha trabalha muito menos horas que Portugal - e não o inverso como há uns anos a esta parte a Chanceler Merkel afirmava, para nos denegrir - mas a produtividade - produção por trabalhador - alemã é muito mais alta, que a nossa.

Mas, por outro lado, a AutoEuropa instalada em Portugal a fazer automóveis para o Grupo e do Grupo VW, é das mais produtivas de  todas as existente. E o Director geral é um português, e a maioria dos trabalhadores são portugueses.

E, todo o qualquer português que trabalha na Continental/Mabor, em Lousado, outra empresa alemã cá instalada, é tão ou mais produtivo que qualquer alemão.

E, todos os portugueses que trabalham por esse mundo fora, do mais alto ao mais baixo patamar da pirâmide hierárquica são tão bons como os demais. O Director geral do Grupo Bayer na Alemanha é um português.

Bem, como todos sabemos o problema não é do Trabalhador Português, o problema é da Organização. As nossas Organizações, por cá, são uma desorganização/ organizada. Por norma no topo da pirâmide não está quem por mérito lá deve estar, mas quem sendo amigo/conhecido de um importante, por favor lá foi parar. Consequentemente não tem a mínima capacidade de fazer o que deve ser feito, para além de se rodear de adjuntos que para lá ficam a marinar, a fazer carreira, e não a fazer um bom trabalho.

Temos por de mais empresas que não têm como ser produtivas, por não terem uma “cabeça” que saiba, o que quer que seja. Para além de numas quantas empresas familiares, a família que como tal é muito capaz, quando passa para a empresa, não resulta.

E, claro, no público o sistema ainda está pior, repleto no topo da pirâmide de jotas, que entraram para as juventudes partidárias e que por lá se eternizaram, tendo-lhes necessariamente sido arranjados lugares, para os quais não têm a mínima aptidão, mas são parte de fazer “parte” dos compromissos, internamente assumidos nos nossos partidos políticos.

 E “isto não qualquer invenção de última hora , basta verificar o percurso da maioria dos políticos e seus afilhados nos últimos 20 anos, onde estavam, por onde foram passando, e onde hoje, ainda,  estarão.  Ver para crer! E sendo algo transversal a todo qualquer partido, a todo e qualquer movimento, do nosso “sistema”!

Quando por mérito for possível mudar a forma de organizar, de trabalhar, de estar, seremos tão ou mais produtivos que os alemães na Alemanha. E não temos que perder quaisquer características, nossas, como não perderam todos os portugueses que trabalham na AutoEuropa a Sul de Lisboa ou na Continental a norte do Porto, ou pelo Mundo fora.

Até lá vamos navegando à vista!

Augusto KÜTTNER DE MAGALHÃES
13 de Julho de 2015

domingo, 12 de julho de 2015

Pensamento rápido nesta noite de catástrofe europeia

1. foi um erro ter metido os países bálticos na União, como se vê. A Finlândia, também não faz cá nada de útil.
2. A Alemanha estava tão bem, dividida em dois! Pena era que não fossem 4 ou 5...
3. Até que enfim que o Sr. Hollande decidiu ter uma coisa que parece natural os homens terem entre as pernas. Parece-me é tarde de mais.
4. Pedro «nós os ricos» Coêlho, o nosso gauleiter, continua a não perceber nada do que nos vai acontecer depois da saída da Grécia.
5. Se houvesse vergonha e dignidade na Europa, o Ministro Schauble, esse expoente máximo do pós-nazismo saudosista alemão, já devia ter sido demitido desde a sua piada grosseira sobre Porto Rico (é insultuoso para os americanos sugerir que Porto Rico integre a União, uma vez que os «europeus» são um bando de castrados).
6. Razão tem o Putin... Com a «europa» lida-se a rir, sem a levar a sério.

quarta-feira, 1 de julho de 2015

Tarefas cruciais para a sociedade civil

Na série de divulgação do Manifesto POR UMA DEMOCRACIA DE QUALIDADE, republicamos este artigo de Fernando Teixeira Mendes, hoje saído no jornal i.
É urgente que se proceda a um escrutínio de todas as contas de todos os partidos. Essas contas deveriam ser auditadas por um corpo de auditores especializados.

Tarefas cruciais para a sociedade civil

Além da alteração do sistema eleitoral para a Assembleia da República, também modificações a nível do sistema de financiamento dos partidos políticos são uma questão fundamental para a transparência do nosso sistema democrático.
É crucial ter-se um sistema de financiamento partidário que evite ou dificulte que as empresas procurem cidadãos para fazerem donativos aos partidos políticos que mais não são do que donativos encapotados das empresas. É também muito importante que se dificulte o aparecimento de indivíduos como facilitadores de negócios nas empresas do sector público estatal.

Os cidadãos portugueses têm todo o direito de saber, com rigor, qual é a origem e qual o valor dos proveitos globais de cada partido político. As autoridades têm de tratar o cálculo dos proveitos dos partidos políticos da mesma forma que tratam o cálculo do rendimento das famílias ou o cálculo dos lucros das empresas!

Está provado que a forma mais barata e mais controlável de financiamento partidário é o financiamento público com verbas alocadas pelo Orçamento do Estado, sistema utilizado com sucesso em vários países.

Eventuais contribuições privadas só devem ser aceites se originárias de pessoas individuais, e só se for possível a respectiva fiscalização pública, por exemplo: pela dedução da colecta em sede de IRS ou ainda através de qualquer outro mecanismo que permita o seu cruzamento com o sistema tributário.

É também urgente que se proceda a um escrutínio completo de todas as contas de todos os partidos. Essas contas deveriam passar a ser auditadas por um corpo de auditores especializados, preferencialmente do Tribunal de Contas, que apresentaria os resultados das auditorias à Assembleia da República.

Recentemente alertaram-me que o Tribunal de Contas não está em condições de fazer este trabalho porque tem poucos recursos. Dado que, seguramente, as perdas para a economia são muito elevadas, mais valia dotar o Tribunal de Contas desses recursos se o processo fosse implementado na sua globalidade. A falta de recursos é uma questão muito facilmente solucionável.

Sobre este e outros assuntos muito importantes, recomendo vivamente a leitura do manifesto “Por Uma Democracia de Qualidade”, que faz referência à necessidade de aplicação de medidas que muito contribuirão para o aumento da transparência do nosso sistema democrático.

Subscrições e ou eventuais informações adicionais ao manifesto podem ser obtidas através do email porumademocraciadequalidade@gmail.com .
Fernando TEIXEIRA MENDES
Gestor de empresas, Engenheiro
NOTA: artigo publicado no jornal i.